quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

PROJETO SEMENTE [2005]


O ano de 2005 foi especialmente interessante por alguns motivos: Eu tinha acabado de concluir meu curso de Licenciatura em Música pela Universidade Estadual do Pará. Eu estava dando aulas particulares de violino e também no Conservatório Carlos Gomes como estagiário. Com isso, fiquei com o tempo relativamente livre durante a semana e com uma graninha boa para investir em coisas minhas.
O que na verdade eu quero enfatizar é minhas atividades na igreja. Esse ano eu era líder da equipe de músicas e presidente do departamento de jovens. Junto com alguns amigos (Jônatas, Cristiane, Vanessa e Eude) começamos a trabalhar na idéia de realizarmos uma viagem missionária de curto período durante as férias. Já tínhamos em vista o campo indígena. No ano anterior eu havia visitado Barra do Corda no Maranhão para fazer pesquisa de campo entre os índios guajajara para obter material para o meu TCC da faculdade. Durante o período que passei ali, supervisionado e orientado pelo missionário Benedito Barbosa, sonhamos com a possibilidade de haver uma equipe de jovens desenvolvendo um trabalho entre os indígenas da região. Lembro perfeitamente de uma de nossas viagens noturnas da aldeia pra cidade quando conversávamos sobre o assunto, imaginando como seria bom se tudo aquilo se tornasse realidade.
Cris, Eude, Héber, Vanessa e Jônatas
Com isso, já tínhamos um destino para nossa empreitada. Entramos em contato com o secretário executivo da missão que trabalhava com aqueles povos e com o missionário de campo responsável pelo trabalho, o já referido Benedito Barbosa, ou Bené. Aquela agência missionário tinha um projeto semelhante àquele que estávamos querendo realizar, mas ainda não tinha a estrutura montada para a primeira equipe. Então aceitamos o desafio de participar do Projeto Semente. Tendo legalizado esses detalhes passamos a correr atrás do nossos sustento pra viagem. Precisávamos ter o dinheiro para as passagens de ônibus até o maranhão, hospedagem, e alimentação. Observando todos esses gastos, observamos que a melhor maneira de economizar seria levando a nossa alimentação na viagem, assim, as pessoas poderiam contribuir com alimentos ao invés de dinheiro. Mas pense numa mala pesaaada com um monte de pacote de arroz, feijão, macarrão, farinha...
Em fevereiro de 2005, com todas as malas prontas e os preparativos arranjados partimos para Barra do Corda numa noite de domingo depois de termos sidos devidamente enviados pelas nossas igrejas. Chegando ali, nos hospedamos por alguns dias na casa do Bené pra planejar as atividades do projeto. Nós havíamos levado um projetor datashow, para passar o filme “O Peregrino”. Mas para usarmos na aldeia, até então, sem energia elétrica era necessário um tanto de parafernália (conversor, adaptador, estabilizador...) pra ligá-lo na bateria da toyta. Diversas vezes, quando nossa parafernália falhava no meio da projeção, enquanto Jõnatas e eu tentávamos arrumar, as meninas ficavam em oração. Ninguém queria que a lâmpada do projetor, caríssima por sinal, queimasse enquanto estávamos de posse. Sempre que voltava a funcionar a frase com sotaque ribeirinho, que ouvíamos do Jônatas era: “É Tu que é o Bããão Senhor! Se num é Tú quem é então?” Foi impressionante como essa frase se fez presente várias vezes durante a viagem. Não só em ocasiões em que falhava o projetor, mas em vários outros momentos onde víamos a ação de Deus.
Noções de higiene bucal
Nossas atividades em todas as aldeias que visitamos eram de evangelismo de crianças, as meninas contavam histórias, cantavam e brincavam com elas enquanto Jônatas, Bené e eu conversávamos com os adultos da aldeia. Também passávamos o filme “O Peregrino” a noite. Esse filme foi escolhido por passar a mensagem do evangelho de forma criativa e simbólica, muito semelhante à maneira dos indígenas de ensinar suas crianças. Um dos eventos que nos marcaram bastante, pelo menos a mim e ao Jônatas que estávamos presentes, ocorreu assim que chegamos na aldeia onde ficaríamos. O Bené estava conversando com um dos indígenas perguntando como estavam. Ele respondeu: “Ah Bené, ninguém cuida da gente aqui na aldeia, estamos igual animal sem dono. Precisamos de gente que nos ensine a bíblia” Essa frase tem ecoado em nossas mentes, sempre que nos lembramos dessa viagem.
Também realizamos alguns trabalhos sociais. Como a Cristiane estava estudando odontologia aproveitamos para fazer um programa de higiente bucal para as crianças. Sob a supervisão da Cris distribuíamos as escovas e pastas de dente, e orientávamos os curumins mostrando a maneira correta de escovar os dentes. Também dirigíamos os cultos nas aldeias onde já haviam igrejas indígenas formadas.
Nossa base era numa das maiores aldeias guajajara da região. Ali nós dormíamos e nos alimentávamos e então partíamos para outras aldeias vizinhas para fazer nossos trabalhos. Além disso, esta aldeia foi uma das primeiras alcançadas pela missão e os missionários viveram ali por muitos anos. Mas nem tudo foram flores. Certa tarde, eu senti um desejo muito grande de alcançarmos aldeias mais afastadas do que aquela onde nos encontrávamos que ainda não haviam sido tão evangelizadas. Apesar das recomendações do Bené de esperarmos o dia seguinte, eu (meio que) forcei a galera a aceitar a idéia de partirmos logo. Pra quê!
Mulheres ajudando a desatolar o carro
Carregamos a Toyota e pegamos estrada... muito ruim por sinal. Quando estava quase anoitecendo, estávamos trilhando uma estrada com duas valas enormes em baixo dos pneus. Como era época de chuva, o local exato da estrada por onde passavam os pneus dos carros que transitavam ali, estava cada vez mais desgastado e profundos, formando um grande monte de terra bem no meio da estrada. Foi bem nesse local que a Toyota encepou. Ela passou com as rodas exatamente nas valas da estrada e como o amontoado de terra entre as valas era muito alto, nosso carro ficou encalhado, sem poder ir para frente ou para trás. O trabalho para tirar de lá foi enorme. Tivemos que cavar em baixo do carro, amarra-lo com cordas e cabos de aço. Depois de muito esforço conseguimos e voltamos para aldeia onde estávamos antes. No dia seguinte, retomamos o mesmo caminho, mas paramos antes do local avariado e seguimos a pé pelos menos 2 km até o nosso destino. O que importa é que o evangelho foi pregado!
Bené depois de desatolar a Toyota
Também tiramos algum tempo para o lazer. Toda a equipe foi com o Bené e sua família para uma cachoeira do rio Corda localizada dentro de uma das aldeias que ele já havia feito contato. Foi um dia muito gostoso de descanso e brincadeiras. Tomamos banho na represa e relaxamos nas águas geladas do rio Corda. Numa das tardes estávamos descansando em nossas redes, debaixo da cobertura do templo da igreja na aldeia onde fizemos nossa base. Ali, o Jônatas pegou o violão e começou a tocar uma música linda com letra bucólica, falando de uma cidade atrás de um monte. A música era “Casinha” de Janires. Enquanto ele cantava e tocava eu imaginava as cenas descritas pela música. Pra mim aquele foi um belo e curto momento de uma grande amizade interpretada pelo som de uma canção. Na última noite do nosso projeto saímos todos juntos para comermos numa pizzaria.
Gostamos tanto da viagem de fevereiro que em julho do mesmo ano, decidimos repetir a dose. A nossa equipe de 5 pessoas (Jônatas, Héber, Vanessa, Eude e Cristiane) fomos para a região do Arame, no maranhão trabalhar com o mesmo povo indígena, mas sob a supervisão de outros missionários da mesma missão que tínhamos ido em fevereiro.
Esta segunda edição do Projeto Semente foi igualmente interessante. Os missionários que nos hospedaram foram Bron Hewitt e o casal Francisco e Damaris. Também passamos 15 dias ali, no entanto, os gastos com a viagem incluíam o aluguel de uma D-20 pois os missionários não tinham condução própria para toda nossa equipe ir. Estivemos ali no período frio e como a cidade era rodeada de montes, o clima ficava bastante ameno durante as manhãs. Fizemos trabalhos com crianças e sobre saúde bucal também. Dessa vez não ficamos morando dentro da aldeia, nós fazíamos viagens para lá todos os dias, e voltávamos para dormir na casa dos missionários.
Usando os enfeites de uma festa tradicional indígena
Ao final do período ali no Arame decidimos prolongar um pouco mais a nossa estadia no Maranhão e rumamos para Barra do Corda para ver o Benedito e sua família e matarmos as saudades deles.
O Projeto Semente nos proporcionou viagens sensacionais que esperamos nunca esquecer. Nossa visão do ministério mudou. Todos nós que participamos tínhamos chamado missionário. Esta experiência serviu para observarmos de perto a realidade do campo e a compreender que a vida missionária, se estamos dispostos a vivê-la, é algo que deve ser levado muito seriamente. Acima de tudo, percebemos como Deus é glorificado através do ministério de pessoas humildes que se dispõe a ser usadas por Ele.

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